RDO – RESOLUÇÃO DE DISPUTAS ON LINE – INCLUSÃO DIGITAL E CONEXÃO DAS PARTES COMO FORMA DE ACESSO À JUSTIÇA
Regina Maria Vasconcelos Dubugras*
A resolução de disputas on line é um meio prático, viável e econômico para resolução de conflitos. São muitos os seus pontos positivos no tocante ao acesso das pessoas às sessões conciliatórias, considerando a desnecessária locomoção com seus custos e riscos de acidentes, furtos e contaminação. A RDO, também não tem fronteiras e permite que a mediação/conciliação seja feita entre pessoas que estejam em outras cidades, estados ou países, favorecendo o acesso e participação de todos por um custo mínimo.
O nosso sistema jurídico prevê expressamente a prática de atos processuais on line. O art. 236 parágrafo terceiro1 do CPC prevê a prática de atos processuais por vídeo conferência e o art. 1982 do mesmo código dispõe sobre o dever de disponibilidade de equipamentos para a prática de atos processuais nas unidades do poder judiciário. A recente Lei n. 13.994 de 24/04/2020 que alterou a Lei 9.099/95 dispõe em seu art. 22 parágrafo segundo3 que é cabível a conciliação não presencial pela utilização de meio tecnológico.
É fato que a exclusão digital ainda é uma realidade no Brasil e a falta de acesso à internet pode ser um obstáculo para que parte da população possa participar da resolução de disputas on line. Contudo, diante da pandemia do Covid 19, das normas de isolamento e das medidas de segurança decorrentes, haverá necessidade de se agilizar o foco das políticas públicas nesta área. Uma das estratégias será promover a ampliação do acesso gratuito descentralizado em locais de fácil acesso à população como Fóruns Judiciais, pontos de ônibus, parques, lotéricas, terminais rodoviários etc., mas já em modelos adaptados para isolamento acústico e pessoal e com os cuidados necessários para evitar a transmissão de vírus e bactérias, nestes pontos de acesso.
Além de um impulso para a ampliação da inclusão digital, as sessões conciliatórias ou mediação judicial on line contam com maior facilidade para serem realizadas, se comparadas com as audiências judiciais que necessitam de coleta de depoimentos e provas orais. Primeiro porque devem ser voluntárias e não obrigatórias e segundo porque não há qualquer problema de desrespeito ao contraditório se as partes contarem com a participação de familiares, na comunicação e tomada de decisão. Esta peculiaridade permite o acesso à internet por compartilhamento, ou seja, a utilização de aparelhos e dados de outro integrante da família.
No processo judicial em litigação, os advogados munidos de procuração com poderes para transigir podem fazer acordo a qualquer tempo, independentemente da participação direta das partes. O modelo de conciliação/mediação colaborativa deve contar com três pilares que o diferencia das propostas conciliatórias feitas pelo Juiz em audiência, são eles: a capacitação específica do conciliador/mediador, que não deve ser o julgador do processo; a dedicação de tempo adequado para a sessão; e participação direta das partes como protagonistas em ambiente conciliatório presencial ou virtual.
Na RDO os princípios da mediação devem ser assegurados, ou seja, a oralidade, a identificação da imagem, a transparência, a informação verdadeira, a autonomia de vontade e a boa fé, além de outros. As fases da mediação são as mesmas da presencial, mas devem guardar certas peculiaridades e cautelas considerando o contato virtual.
A recepção das partes e advogados em sala digital deve ser feita de forma acolhedora pelo conciliador/mediador, de tal forma que todos se sintam integrados a tranquilos. Na RDO a identificação dos participantes pode ser feita por exibição da imagem pessoal e de documentos com o reconhecimento pela outra parte, para evitar fraudes e simulação. para a busca da segurança na expressão de vontade das partes.
A apresentação da mediação on line deve levar em conta a qualidade da comunicação e da conexão esclarecendo que qualquer perda de sinal deve ser imediatamente comunicada por meio complementar, como por exemplo, whatsApp ou telefone preferencialmente em viva voz, sem prejuízo do adiamento da sessão, aproveitando os atos e diálogos até então praticados. É importante informar o tempo disponível para a sessão em compatibilidade com o que foi reservado na plataforma e a possibilidade ou não de ampliar ou adiar para outra data se for necessário.
A manifestação das partes e advogados sobre as questões e expectativas deve seguir os mesmos procedimentos da mediação presencial com mais rigor para que cada um tenha sua vez de falar, sob pena de criar-se confusão de vozes, o que é mais prejudicial em sessões on line do que nas presenciais. As sessões privadas também são possíveis com a desconexão daqueles que devam se ausentar, devendo ficar pré-estabelecido quanto tempo vão perdurar para que se organize o retorno à sessão conjunta.
A negociação das partes com a criação de opções para a solução das questões, deve se utilizar da linguagem escrita além da verbal, podendo o mediador compartilhar na tela por escrito, tanto as opções como o que foi acordado, para assim assegurar o entendimento e concordância de todos os participantes. Nesta fase é muito importante a legitimação da vontade das partes, em respeito ao princípio da autonomia e manifestação da vontade.
Em conclusão, podemos afirmar que a resolução de disputas on line é aplicável junto ao poder judiciário, contudo, a exclusão digital de parte da população, não deve ser justificativa para a dispensa da participação das partes nas sessões de conciliação e mediação colaborativa. Pelo contrário, a conciliação e mediação judicial on line deve ser fator de incentivo às políticas públicas de inclusão digital com oferecimento de aparelhos e dados gratuitos para quem necessitar viabilizando a participação das partes e advogados, como pressuposto de acesso à justiça.
Regina Maria Vasconcelos Dubugras foi juíza e desembargadora do TRT/SP, é mestre e doutora pela Faculdade de Direito da USP, Coordenadora e Professora dos Cursos de Formação de Conciliadores do TRT/SP e Vencedora do III Prêmio Innovare na categoria Juiz Individual.
1 § 3º Admite-se a prática de atos processuais por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real.
2 Art. 198. As unidades do Poder Judiciário deverão manter gratuitamente, à disposição dos interessados, equipamentos necessários à prática de atos processuais e à consulta e ao acesso ao sistema e aos documentos dele constantes.
3 § 2º É cabível a conciliação não presencial conduzida pelo Juizado mediante o emprego dos recursos tecnológicos disponíveis de transmissão de sons e imagens em tempo real, devendo o resultado da tentativa de conciliação ser reduzido a escrito com os anexos pertinentes.” (NR)