O TRT da 2ª Região (TRT-2) sediou, nessa segunda-feira (17/11), o evento “Ninguém se cala contra a violência de gênero”, no auditório Juiz Amauri Mascaro Nascimento, no Fórum Ruy Barbosa, em São Paulo-SP. A iniciativa teve como objetivo principal o enfrentamento da violência de gênero, reforçando o engajamento para uma causa em que "não admite silenciamento". Confira o álbum de fotos.
O seminário também celebrou os dois anos do Pacto Ninguém se Cala, criado em 2023 pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP), com o propósito de garantir proteção e auxílio às mulheres em situação de risco e/ou vítimas de assédio, abuso, violência e importunação em espaços públicos.
Durante a solenidade, o pacto recolheu a assinatura de novos termos de adesão, superando o número de 100 instituições aderentes, incluindo sindicatos, universidades, empresas e órgãos públicos.
Na abertura, o presidente do TRT-2, desembargador Valdir Florindo, afirmou que o Tribunal, ao sediar o evento, reafirma seu engajamento na causa. Destacou que o combate à violência "não é apenas dever do Estado, é compromisso da sociedade e de cada um de nós". O presidente ainda mencionou o lançamento, neste ano, do programa Laços de Proteção.
Trata-se de um projeto do regional que oferece suporte e acolhimento a magistradas, servidoras, estagiárias e cidadãs em situação de violência doméstica ou familiar. “O papel da Presidência é garantir que o TRT-2 seguirá presente, atuante e mobilizado para que ninguém se cale contra a violência de gênero”, concluiu.

A procuradora-chefe da Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região, Vera Lúcia Carlos, alertou para a gravidade da situação, citando pesquisas de 2024 que apontam que mais de 21 milhões de mulheres já sofreram algum tipo de violência ou assédio no país, o que equivale a 2.400 mulheres sendo violentadas por hora.
Também representando o MPT, o vice-procurador, Nei Messias Vieira, destacou que a intolerância é uma das matrizes da violência de gênero. Ele alertou que o ambiente laboral é um dos palcos onde a violência se encena todos os dias, "seja pelo assédio, seja pela discriminação que insistem em se disfarçar de normalidade".
Também fizeram parte da mesa de abertura o subprocurador-geral de Justiça Criminal, Ivan Francisco Pereira Agostinho; a desembargadora do Tribunal Regional Federal da 3ª Região Cristina Melo; a deputada estadual Marina Helou; a juíza federal Rafaela Caldeira Gonçalves (representando a Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário do Estado de São Paulo); a secretária de políticas para as mulheres do Estado de São Paulo, Valéria Bolsonaro; e a coordenadora nacional da Coordigualdade do MPT, Danielle Olivares.
O pacto
A procuradora regional do Trabalho e vice-gerente do “Projeto Nacional Estratégico Florir: semeando ações pelo fim da violência contra a mulher”, Adriane Reis de Araújo, e a promotora de Justiça e coordenadora do Núcleo de Gênero do MPT, Vanessa Therezinha Sousa de Almeida, abriram o ciclo de palestras com a apresentação do Pacto Ninguém se Cala.
O corregedor nacional do Ministério Público, procurador Ângelo Fabiano Farias da Costa, participou de forma on-line e disse que a Corregedoria Nacional tem atuado para aperfeiçoar o trabalho do Ministério Público brasileiro no combate às violências, buscando, por meio de atuação e correições, "reduzir os índices de feminicídio" e garantir que as mulheres sejam respeitadas em todos os ambientes, inclusive em espaços públicos como bares e casas noturnas.
Laços de Proteção
A corregedora do TRT-2, desembargadora Sueli Tomé da Ponte, a desembargadora Catarina von Zuben e a diretora da Ouvidoria da 2ª Região, Claudia Polachini Kayatt, apresentaram o Programa Laços de Proteção, que decorre de uma resolução do CNJ que determina aos tribunais a criação de medidas protetivas para magistradas, servidoras e terceirizadas.
Elas explicaram o que é o projeto, detalharam o funcionamento da rede de acolhimento e apresentaram cartilha de apoio. O material é utilizado para que a mulher identifique que a violência nem sempre é física, abrangendo violência patrimonial, moral e psicológica.

Consentimento
A pesquisadora Beatriz Accioly abordou a complexidade do consentimento, afirmando que a conversa sobre o tema ainda está "muito aquém da onde a gente precisa chegar como sociedade". Beatriz chamou atenção para os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública: houve mais de 87 mil estupros registrados em 2024, mas apenas 1% dos casos chegaram à condenação.
A palestrante criticou o fato de que o direito penal trabalha com premissas binárias, como "liberdade ou não" ,enquanto as interações sexuais ocorrem em zonas cinzentas. Ela propôs que, em vez de apenas buscar um checklist de autorização, a sociedade caminhe na direção de relações baseadas na reciprocidade, onde o cuidado mútuo, o desejo e o prazer sejam tão importantes quanto o consentimento.
Políticas públicas e boas práticas
O evento contou com depoimentos de vários(as) representantes de prefeituras, órgãos públicos e entidades privadas, que falaram sobre suas experiências e projetos relacionados aos objetivos do pacto. Uma das convidadas foi a advogada Regina Célia da Silveira Santana, da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da capital paulista, que citou, entre outros exemplos, a criação do Programa Tempo de Despertar, que promove a reflexão, conscientização e responsabilização dos autores de violência doméstica, por meio de grupos reflexivos de homens; e o Auxílio Ampara, que apoia crianças e adolescentes órfãos em razão de feminicídio.
Silvia Melo, diretora de comunicação da União dos Vereadores do Estado de São Paulo (Uvesp) falou sobre outro tipo de violência: a violência política contra a mulher. Nesse sentido, propôs ao Ministério Público um documento simplificado que possa servir para todas as câmaras municipais do Estado de São Paulo. Corroborando a busca pela igualdade na política, a mediadora do painel, Isabela Jourdan da Cruz Moura (promotora de Justiça do MP-RJ) destacou: "A gente não ter a adequada representatividade é uma ofensa à democracia".
Hip hop e ações educativas
A cultura e a arte também marcaram presença no seminário. Algumas representantes da Frente Nacional de Mulheres no Hip Hop, rede organizada por mulheres, ativistas, artistas e simpatizantes, mostraram seu talento e manifesto por meio de elementos do hip hop: música (com apresentação de DJ e MC), arte visual (grafite), dança (breaking) e conhecimento (origens, histórias e posicionamento).
A educação também foi tema de destaque nas apresentações. Relatos citaram a importância da capacitação de equipes de diversas áreas e profissões — por meio de cursos, treinamentos, visitas, rodas de conversa etc. —, com o fim de preparar essas pessoas para saberem como agir em situações de violência, seja em universidades, eventos, estádios etc.
A criação (ou a atualização) de cartilhas, guias, protocolos, normas e documentos também foi abordada durante o seminário, tendo em vista a importância e a praticidade para a disseminação de conhecimento e avanços em prol da causa.
Espaços de acolhimento
Um exemplo bastante citado no evento foram os espaços e salas de acolhimento, voltados para atender às vítimas de violência e orientá-las da melhor forma possível em locais como estádios de futebol, shoppings, faculdades, áreas de lazer etc.
Os canais de denúncia também são opções necessárias para que se possa promover uma ampla transformação cultural e social e, assim, mudar a triste realidade desse cenário cruel de violência e injustiça contra todas as mulheres.
